O reino imaginal | O mundo intermediário entre a mente e a realidade física

A imaginação é a força motriz por trás de toda criatividade e inovação, permitindo-nos sonhar, resolver problemas e interagir com uma camada da realidade que vai além do mundo material. Essa dimensão é conhecida, segundo o filósofo Henry Corbin, como o reino imaginal. Diferente de uma invenção subjetiva ou de uma simples fantasia, o reino imaginal é uma realidade ontológica, ou seja, ele existe de fato, com suas próprias leis e estruturas, atuando como um “mundo intermediário” entre o puramente espiritual e o puramente físico. É o espaço onde as verdades espirituais e os símbolos ganham forma, a linguagem do inconsciente que se manifesta em sonhos, visões e em nossa imaginação diária.

O Olho do Coração: O Órgão de Percepção do Reino Imaginal

Para perceber essa dimensão, é necessário desenvolver o que as tradições sufis chamam de “olho do coração”. Essa faculdade, vista como a sede da gnose (conhecimento direto), não inventa coisas, mas nos permite ver e compreender o que já existe no reino imaginal. O coração é considerado a morada da alma, e a imaginação é a ferramenta que nos permite decifrar a linguagem simbólica desse reino, seja por meio de visões ou da prática deliberada de visualização.

O reino imaginal serve como uma ponte que dá corpo às verdades espirituais. É aqui que uma energia de proteção se manifesta como a imagem de um anjo, ou a sabedoria se traduz na figura de um ancião. No entanto, nossa percepção desse reino é filtrada por nossos próprios complexos psicológicos. Carl Jung afirmava que os nossos “complexos” (aglomerados de emoções e crenças) podem distorcer as imagens que emergem do reino imaginal. Verdades espirituais neutras podem parecer assustadoras ou enganosas se nossa psique estiver “sintonizada” para interpretá-las através de lentes de inadequação ou medo. O olho do coração, embora seja o portal, está intimamente ligado ao nosso inconsciente pessoal, onde esses complexos residem.

A Manifestação da Realidade: Da Intenção à Materialização

O pesquisador Gregg Braden sugere que o universo é um campo de energia interconectado que responde à linguagem do sentir, uma linguagem que emana do coração, como no sufismo. Segundo essa visão, a mente universal é a fonte de toda a consciência e o potencial de tudo o que existe. É dela que surgem o mundo do intelecto puro (das ideias perfeitas), o mundo espiritual (a energia) e o reino imaginal, que serve como uma ponte para o mundo físico.

O reino imaginal é o campo onde os seres e as forças do mundo espiritual interagem com a nossa consciência, e as visões que temos são a forma que essas entidades assumem para se comunicar conosco, já que nossa mente, limitada pelos sentidos, precisa de imagens para entender o que é puramente espiritual.

O coração é nosso centro de intuição e percepção espiritual, a ponte direta com o mundo espiritual onde a alma reside. Ele é o primeiro a sentir a intenção que emana do mundo espiritual e, em seguida, usa a imaginação para traduzi-la em uma imagem ou símbolo. Assim, a imaginação, guiada pelo coração, é a ponte que conecta o sentimento espiritual com a realidade física.

A Genialidade como Ato de Sintonizar o Invisível

A inspiração divina é um influxo direto de conhecimento ou energia que vem do mundo espiritual, e o reino imaginal atua como um prisma, decompondo essa luz em formas e cores que a alma pode entender. É por isso que, nas tradições sufis, se diz que poetas, artistas e visionários recebem sua inspiração do “terceiro céu”. Cada invenção, obra de arte ou sociedade foi primeiramente imaginada no reino imaginal. O que chamamos de “inspiração” é, na verdade, nossa consciência sintonizando esse domínio e percebendo uma imagem que ainda não se manifestou no mundo físico.

Para acessar o reino imaginal de forma clara, é fundamental silenciar a mente racional e suas preocupações. A meditação e a contemplação são ferramentas essenciais para aquietar a mente e permitir que o coração e a imaginação recebam as imagens, em vez de tentar criá-las. Ao purificar o coração e a mente, o indivíduo pode acessar a sabedoria profunda da alma, percebendo uma realidade maior. É assim que os místicos “veem Deus” — não com os olhos físicos, mas com o olho iluminado da alma, aprendendo a decifrar a linguagem simbólica do divino para finalmente se unir à fonte de toda a realidade.

Leitura:  

-Carl G. Jung (1964). O homem e seus símbolos.

-Henry Corbin (1964). Mundus imaginalis.

-Lynne McTaggart (2001). The field: The quest for the secret force of the universe.

-Gregg Braden (2006). A matriz divina.

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